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A medida do amor

A medida do amor é amar sem medida. O que queria Santo Agostinho com essa assertiva? Amar sem medida? O que é uma medida? O amor pode ser medido? Pode-se medir o amor de uma mãe que, generosa, faz da vida dos filhos a própria vida? Que, em noites indormidas, acalenta a dor dos seus rebentos? Que se multiplica para atender a avidez por respostas dos filhos inquietos? Pode-se medir o amor de um religioso que faz de sua vida uma entrega a Deus e ao seu próximo? Que repete o ensinamento de Madre Teresa de Calcutá, a peregrina do amor, que dizia que quem julga  as pessoas não tem tempo para amá-las? Pode-se medir o amor de um cidadão comprometido com a geração que virá depois e que, por isso, cuida da Casa Comum que é o planeta em que vivemos? Pode-se medir o amor de uma mulher ou de um homem apaixonado que resolve dividir o que tem, o que sabe, o que sonha com outro alguém que chegou por alguma razão que nem a razão imagina e que permaneceu? Renúncias e encontros. Amargores e sabores. Caminhadas apedregulhadas de surpresas. Mas juntos. Juntos por uma decisão de não medir o amor. O poeta Drummond nos ajuda a compreender as “Sem-razões do amor”: Eu te amo porque te amo, /Não precisas ser amante,/ e nem sempre sabes sê-lo./ Eu te amo porque te amo./ Amor é estado de graça e com amor não se paga.

Amigos também amam. Professores também. Médicos. Juízes. Atores e atrizes, senhores das emoções. Amam os que se põem a conhecer melhor os outros. Porque quem não conhece não é capaz de amar. E quem conhece, verdadeiramente, ama. Ama inclusive as imperfeições. Ama como resistência ao que é descartável ou medido. Não se mede o amor. Nem o descarta. Senão não é amor. Não é amar.

Sábio Santo Agostinho que, ainda sobre o amor, dizia: “ama e faz o quiseres”. Primeiramente, ame. O que virá depois não há como não ser bom, pois “Se tiveres o amor enraizado em ti, nenhuma coisa senão o amor serão os teus frutos.”

Por: Gabriel Chalita (fonte: Diário de S. Paulo) | Data: 21/08/2015

Coragem para amar

Diz Santo Agostinho: “A esperança tem duas filhas lindas, a indignação e a coragem; a indignação nos ensina a não aceitar as coisas como estão; a coragem, a mudá-las”. O filósofo escreveu sobre a conduta humana, sobre os erros e os acertos que cometemos em nossa trajetória. Confessou ele os dissabores que viveu. Falou de escolhas equivocadas. Dos males que a ausência de amor é capaz de causar. E nos iluminou com a esperança.

O olhar atento ao mundo talvez seja motivo para desacreditarmos do ser humano. As misérias humanas não nos surpreendem mais. Acostumamo-nos com a maldade, com a mentira, com a injustiça, o que é triste e demonstra que estamos negando nossa própria essência. Perdemos nossa capacidade de indignação. Acovardamo-nos diante da vida. Cada vez menos falamos de valores como generosidade,companheirismo, respeito e compaixão. Interesses pouco humanos estão transformando as nossas relações em palcos de guerra. Guerreamos contra o diferente ou contra o semelhante que pode ocupar o nosso espaço – tosca impressão, porque nada nos pertence. Partiremos, um dia, como chegamos: carregando apenas uma chama inapagável que se chama amor. É o amor que nos identifica, que nos retira da multidão, que nos faz únicos. Entretanto, com essas turbulências todas, é preciso coragem para amar, para não se deixar levar pelos equívocos de um aplauso rápido por ter atingido alguém com a pedra da crueldade. A vítima é um irmão meu. Um irmão é como uma parte de um mesmo corpo. Quando atingido, o corpo todo dói. Talvez por isso uma dor comum nos adoeça. Doentes ficamos todos quando não nos indignamos ao ver as injustiças contra o nosso irmão. Fechar os olhos não resolve a dor alheia nem a nossa.

Coragem. Se não temos o poder de mudar o mundo, mudemos o mundo que nos cerca. Comecemos uma silenciosa revolução no nosso entorno, mostrando que somos capazes de fazer as escolhas corretas. Com aquilo que fica para sempre: Amor, amar. 

Por: Gabriel Chalita (fonte: Diário de S. Paulo) | Data: 31/07/2015

 

O mal existe?

A existência do mal foi um dos problemas filosóficos enfrentados por um dos mais importantes pensadores do cristianismo, Santo Agostinho. Agostinho abordou o tema dentro de uma lógica de premissas, para ele,  incontestáveis. As duas primeiras são: “Deus criou todas as coisas” e “Deus é plenamente bom”. Diante dessas assertivas, como encaixar a existência do mal? Se Deus é plenamente bom, não poderia ter criado o mal. Se Deus criou todas as coisas, nem o homem nem ninguém poderia ter criado o mal. Então, o mal não existe?

O mal essencial, talvez, não exista. Na perspectiva agostiniana, o mal é a ausência do bem, é a ignorância diante do que nos faz felizes ou não, como queria outro pensador chamado Aristóteles. Ignorar a bondade nos faz pessoas perversas. Ignorar a beleza da verdade nos faz pessoas despreocupadas com o uso da mentira. Ignorar o respeito ao outro nos faz insensíveis. E assim por diante. Na prática, o mal existe. E é fruto da liberdade do homem em fazer o correto ou se deixar levar por algo que, aparentemente, lhe traga alguma vantagem. O corrupto pratica um mal porque pega o que não lhe pertence. Sua ação é danosa à sociedade. O mentiroso também pratica um mal porque espalha inverdades que visam destruir pessoas ou conceitos. O que trai, o que dá mau exemplo, o que desconstrói histórias de vida, igualmente, pratica o mal.

Imaginemos um jornalista comprometido com o erro, com a mentira, com a injustiça, quanto de estrago ele é capaz de fazer! Assim, também, um pai de família que opta pela violência e não pelo afeto. Ou um motorista que dirija embriagado. Ou um promotor de justiça movido pelo ódio e não pela defesa da sociedade. Na vida, encontraremos pessoas assim. Os bons e os que desconhecem a felicidade serena dos que acreditam no amor. Tenho repetido que nunca vi um perverso ser feliz. São pessoas atormentadas que fazem da vida um tormento para si e para os outros. Gosto de Santo Agostinho e me inspiro nele. Vale a pena ser bom!  

Por: Gabriel Chalita (fonte: Diário de S. Paulo) | Data: 19/06/2015